![]() Carta para Pedro Malasartes
Ora escrevo esta missiva, senhor Pedro Malasartes, como uma vã tentativa de reviver suas artes. Já formei a comitiva liderada por Descartes. Vou dividir em três partes as dimenções do projeto: um miolo e dois encartes, pra cada parte, um trajeto. Cabe ao senhor dois apartes, e um comentário discrreto. E rogo ao Grande Arquiteto, que, no céu, é soberano, que fique por lá bem quieto, pois pra Ele eu tenho um plano: chancelar como correto, caso eu cometa um engano: Era uma vez um cigano, cabra de grande visão, que, no império romano, fez um judeu e um cristão, à parte, um ledo engano, um ao outro dar a mão. O mais sábio, Salomão, já no avançar da idade; o outro, Ciço Romão, no viço da mocidade, encontraram Lampião num cabaré da cidade. Assim se fez amizade entre padre e rabino, o lucro e a caridade, o acaso e o destino, a mentira e a verdade, a espingarda e o sino. E o capitão Virgulino levou os dois pro sertão. Fez padre virar rabino, e rabino sacristão. Sob a benção do divino e até mesmo o alcorão. E assim dividiu-se o pão, o tabaco, a cachaça... a rapadura, o feijão... o pigarro, a fumaça... o fiado, a pretação... e o enterro de graça E assim nasceu a pirraça entre empregado e patrão, o caçador e a caça, policial e ladrão... entre a caneca e a taça a fé e a religião. E também a união, entre a uva e vinho, entre o homem e o cão, entre a rosa e o espinho, e entre Eva e Adão, a solidão e o sozinho. E assim abriu-se o caminho pra dar vasão à cultura, Com Malasartes, o padrinho, a narrar sua aventura, mesmo mentindo um pouquinho , ao exaltar a bravura. Da missiva, a essa altura, Malasartes, me despeço, pois a noite está escura e tenho medo, confesso. Fica minha assinatura e o endereço no verso. E, finalmente, lhe peço, em reverência à cultura, que me deseje sucesso nesta ferrenha procura, pra que eu possa ter acesso aos dons da literatura. Herculano Alencar
Enviado por Herculano Alencar em 07/08/2020
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